segunda-feira, 4 de abril de 2011

Não existe fascismo do bem



Antes de ler este texto, peço que leiam o artigo abaixo, que Noblat publicou n´O Globo de 4 de abril de 2011. Nele o articulista defende os direitos democráticos do deputado federal Jair Bolsonaro e critica quem se indignou com as declarações homofóbicas, racistas e autoritárias do deputado e quer vê-lo fora da arena política:


Cuidado, esse artigo contém bossalidades! Acaso Noblat queria que o povo assistisse bestializado a marcha do preconceito passar? Defender a minoria que quer eliminar as minorias. Isso é meio ilógico, não?


Convido-os a uma breve reflexão filosófica sobre o assunto:


1- O que explica que os leitores do Noblat, d´O Globo, de um modo geral, não se assustem com o caráter ilógico de seu texto: defender os direitos à pluralidade democrática de uma minoria que pretende eliminar os direitos à pluralidade democrática das demais minorias?


2- Ora, o que dá sentido a este argumento não está no discurso, mas nas práticas sociais, no preconceito que salta as linhas do artigo! A maioria da classe média leitora d´O Globo quer ridicularizar a figura de Lula – ou pelo menos o editorial do jornal – pois vê nele um jeca, alguém menor, que não sabe o que fala e nunca poderia ter sido presidente. O que é isso se não preconceito de classe? Tentativa forçada de distinção social e adoção de uma postura de superioridade de status que, na prática, há muito é inexistente.


3- O que dá sentido ao texto do Noblat não é a busca por pluralidade democrática, mas o preconceito de classe! Por isso os típicos leitores d´O Globo, imbuídos de preconceito e desejo de distinção social, não percebem a irracionalidade do argumento e igualam uma brincadeira em âmbito privado, de um presidente que buscou defender os direitos das minorias (mesmo não encarando de frente os conflitos de classe), com o discurso preconceituoso que pauta a agenda pública do deputado Jair Bolsonaro, um raivoso crítico dos fundamentos básicos da democracia e da liberdade de expressão individual.

4- Neste ponto eu gostaria de afirmar que não acredito que os militares e pensionistas votem em Bolsonaro somente por questões corporativas e financeiras. O Bolsonaro tem vez entre os militares porque representa um ranço anti-democrático persistente entre eles, ranço que está difuso entre parcela de nossa população, saudosista de um regime que equilibrava os antagonismos na base do cassete e da tortura. Seu discurso fala o que muitos tem medo de falar, mas grande desejo. Muitos brasileiros ainda não se adaptaram ao cotidiano conflituoso das sociedades democráticas e idealizam um passado ditatorial supostamente "pacífico". Que nunca existiu. E vale destacar, muito da violência rural e urbana que existe hoje no Brasil é fruto da incompetente política social da ditadura militar, que foi incapaz (ou nunca teve a intenção?) de resolver o grave problema da desigualdade em nosso país.


5- O Brasil está muito atrasado, na Argentina o governo prende os torturadores das finadas ditaduras, para entrerrá-las de vez. Aqui um sujeito que defende publicamente a tortura mantem-se como deputado federal devido à imunidade parlamentar. Contudo, nas diversas ações coletivas efetivas, sejam em protestos de rua sejam manifestações virtuais, uma parcela do povo brasileiro mostrou que não tolera mais o tipo de preconceito e repressão exercido por Bolsonaro. E se existem meios legais de caçar este mandato homofóbico, racista e autoritário, essa parcela da população (eu aí incluído!) tem todo o direito de tentar tirá-lo da cena política oficial. Se possível para todo o sempre. A tolerância com a falta de limites é algo típico das democracias ou das ditaduras?

Deslegitimar as ações coletivas populares contra um deputado que infringiu leis democráticas, como faz Noblat, é que, sim, tem um caráter autoritário. A revolta popular contra tentativas de tirania é exercício e o próprio âmago da democracia.

6- Existe uma placa de agradecimento ao Bolsonaro pelas verbas das obras e equipamentos novos no (bom) Hospital Central da Aeronáutica, no Engenho Novo, bairro da zona norte do Rio de Janeiro. Verbas estas liberadas pelo governo Lula! Reparem bem no equívoco da centro-esquerda: deixar um extremista conservador ganhar nome com as verbas do governo Lula! Está mais do que na hora da esquerda e da centro-esquerda lançarem um nome forte entre os militares e enfrentarem seriamente a questão do lugar das forças armadas em uma democracia pluralista.

7- Por fim, por que o Noblat não fala em seu texto das ameaças de morte pelas quais o deputado federal, Jean Willys (PSOL-RJ), vem sofrendo por parte dessa minoria homofóbica, cujos direitos políticos o articulista d´O Globo defende em seu artigo? Pensemos na questão que há muitos atordoa, ou ao menos deveria aturdir: qual é o limite democrático do equilíbrio de antagonismos no plural Brasil contemporâneo?

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