quinta-feira, 8 de novembro de 2007

A revista Veja e sua crítica autoritária sobre Hugo Chávez - (um comentário crítico à matéria “À Sombra de ‘El Supremo’, de 7 de novembro de 2007)


Infelizmente concordo com a revista Veja que as alterações constitucionais venezuelanas criando as novas leis: “de exceção", de Regiões Militares Especiais e de criação, pelo presidente, de comunas auto-gestionadas (?) são excessivamente centralizadoras e contém em si o risco de autoritarismo.

Chávez vem mesmo abusando do personalismo e da centralização. Contudo estes fatores podem mais aproximá-lo de uma "via stalinista" do que de Hitler e Mussolini, como quer a comparação tendenciosa e sensacionalista que a revista "Veja" promove em sua matéria de capa desta semana. Estas medidas aproximam o chavismo de uma tradicional via autoritária de socialismo (deturpado, pois o socialismo só pode se concretizar em uma democracia PLENA), e infelizmente podem distanciá-lo de um importante e inovador "socialismo do século XXI".

Também a megalomania do discurso "bolivariano" é passível de críticas, pois nada indica que Chávez seja um líder continental, e nem seria bom que acumulasse tanto poder.

Porém, as críticas promovidas por "Veja" são, como era de se esperar, autoritárias, pois não apenas usam de sensacionalismo para depreciar Chávez (como no caso da comparação com nazi-fascismo), mas também desqualificam quem apóia seu governo, que, aliás, são democraticamente mais da metade da população venezuelana. Os jovens pobres que têm a oportunidade de estudar nas novas universidades criadas pelo atual governo são tachados de "inocentes" e de "massa de manobra". Ora, se um governo é bom para os empresários é muito natural que os empresários apóiem esse governo (como no caso da Ditadura Militar brasileira), pois as políticas de Estado são direcionadas para esta classe. Então, se o governo eleito democraticamente de Hugo Chávez prefere direcionar suas políticas públicas para os trabalhadores pobres (não apenas os jovens), não há por que se espantar que essa classe dê apoio a tal governo. As diferentes opções políticas e ideológicas irão agradar diferentes classes sociais, ao menos preferencialmente. É isso que o discurso político conservador presente na Veja quer ocultar, como se todos que apóiam Chavez fossem "manipulados" e "inocentes", ou seja, a Veja está desdenhando da opinião pública do povo Venezuelano. E quem desdenha da opinião pública de um outro povo além de anti-democrático está sendo imperialista. Portanto, a Veja faz com Chávez o mesmo que critica nele.

Quanto ao discurso sensacionalista sobre o petróleo, aqui se constata todo o conservadorismo presente na ideologia da revista Veja. Ora, o petróleo é um recurso mineral, bem público de uma nação. Usar os imensos lucros da petrolífera estatal, PDVSA - que chegam a níveis astronômicos devido à valorização do barril do petróleo - para investir em serviços públicos como saúde, educação, moradia, tecnologia, etc. e ainda criar programas sociais assistenciais para quem necessita é o que se esperava de qualquer político republicano e democrático, uma atitude elogiável. Que motivo há para condenar isso senão uma oposição "ideológica" (em outras palavras, de discurso que favorece certas classes sociais)? A Veja preferia que este dinheiro estivesse sendo usado para pagar dívidas ao FMI? Ou para financiar as multinacionais? Respondam jornalistas da Veja!

E a reforma agrária?! A Veja nem lembra mais que ela também está sendo feita na Venezuela. Quem antes estava desempregado ou ganhava um salário rural "de fome" hoje está tendo a oportunidade de plantar em suas próprias terras e com financiamento... do governo! Realmente estes devem ter mil motivos para odiar o governo de Hugo Chávez!
A resvista também omite que a nova reforma constitucional reduz a jornada de trabalho diária dos venezuelanos de 8 horas para 6 horas. Os trabalhadores terão mais tempo e liberdade para o estudo, o lazer, a cultura, a política e organização comunitária. O trabalho torna-se um processo menos compulsório e mais prazeroso. Em oposição ao que acontece em países que seguem a cartilha neolibreal, com aumento da carga de trabalho e restrição aos direitos trabalhistas, na Venezuela ocorre a expansão dos direitos dos trabalhadores.

Por fim a Veja ainda diz que o governo chavista está se armando para violentar o povo venezuelano quando este se voltar contra ele. Se o chavisamo seguir o caminho stalinista da burocratização e da centralização excessiva isso até poderá se tornar uma hipótese futura. Mas o mais incrível é como os jornalistas da Veja se esquecem que o governo eleito, democraticamente, de Chávez, passou por uma tentativa de Golpe de Estado em 2002, apoiado, publicamente, pela elite "liberal" Venezuelana e pela CIA e os "democratas" do governo dos EUA. Então, tudo indica que o governo de Chavez está se armando contra esses dois agentes sociais específicos e não contra o povo venezuelano.

Contudo, os socialistas não devem praticar idolatrias. Mesmo apoiando o governo de Chávez até o momento, sou radicalmente contra as propostas de alterações constitucionais e realmente torço para que o povo da Venezuela vote, mais uma vez democraticamente, pelo veto de tais medidas. As mudanças constitucionais tem como objetivo permitir a aceleraração do processo de reformas sociais socialistas que vem sendo aprovadas pela maioria da população venezuelana. Porém, do modo que estão sendo propostas concentram em demasia o poder nas mãos do presidente Hugo Chávez, aumentando o risco de uma virada autoritária do movimento bolivariano, até então socialista e democrático.

Em níveis moderados a centralização do Estado pode facilitar que este atenda as demandas populares por serviços e políticas sociais fundamentais para uma sociedade verdadeiramente democrática. Mas em níveis exagerados a centralização sufoca as ações da sociedade civil e as demandas da opinião pública. O Estado deixa de existir para o povo e passa a existir para si. Medidas como o controle do Banco Central pelo poder público são fundamentais para se romper com a ditadura econômica e tecnocrática dos "neoliberais" (eufemismo para conservadores que acham que o povo não deve dar opinião sobre a organização econômica). Se o povo eleger, democraticamente, Chávez por mais um mandato, ok, afinal ele já simboliza o processo de mudança social efetivo por que passa a Venezuela. Mas para que ele não se torne um ditador é fundamental que os autogovernos comunais sejam criados pelo povo e não impostos pelo presidente e que este não tenha o poder de decretar "estado de exceção" quando quiser e bem entender, acabando com as garantias dos direitos civis e a liberdade de imprensa - numa democracia é fundamental que a oposição possa ter voz, seja nas escolas, nas ruas ou na assembléia federal (e desta ela desistiu de participar por livre e espontânea vontade).

A Venezuela já é uma nova experiência socialista. Tem a oportunidade de não repetir os erros da experiência fracassada do "Leste europeu" e ser uma alternativa ao imperial capitalismo contemporâneo, socialmente e ecologicamente insustentável. O socialismo do século XXI tem reais condições para se tornar uma alternativa efetiva à civilização capitalista, mas para isso não poderá repetir os conhecidos erros do passado.

Um comentário:

Fique simples. disse...

muito bom o seu texto.Finalmente consegui ler algo sem parcialidade,e que exemplifica a real situação sem interesses.Muito bom.